Alteração Tributária no Ovo: Intervenção na livre iniciativa sobre alimento imprescindível aos mais carentes

Alteração Tributária no Ovo: Intervenção na livre iniciativa sobre alimento imprescindível aos mais carentes

Quem acompanha o dia a dia da área tributária estadual, se deparou com uma nova lei complementar e um novo decreto estadual que modificou o tratamento tributário do OVO.

Em plena pandemia, quando mais desempregados e pessoas sem a garantia alimentar estão nas ruas a pedir, e que encontram no ovo sua única proteína diária, uma intervenção tributária deixa a coisa ainda pior: foi sancionada a Lei Complementar 209/20, que, de forma imperceptível, alterou a tributação do ovo. Eis o artigo 18-A instituído pela LC 209/20:

“Art. 18-A. Fica concedido aos produtores de ovos, localizados no Estado do Amazonas, crédito fiscal presumido, correspondente a 100% (cem por cento) do valor do ICMS devido nas saídas internas de ovos, nos moldes do benefício concedido pelo Regulamento ICMS do Estado de Rondônia, Anexo IV, Parte 2, Item 10, conforme autorização prevista na Cláusula Décima Terceira do Convênio ICMS 190/17, de 15 de dezembro de 2017, em substituição a todos os créditos fiscais a que teria direito na correspondente operação.”

Depois, por meio do Decreto estadual nº 43.182/20, o Governo assim regulamentou a matéria nos artigos 3º e 4º:

Art. 3º Fica alterado o art. 3º do Decreto nº 23.992, de 22 de dezembro de 2003, que passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 3° A isenção do ICMS prevista no Convênio ICMS 44/75, de 10 de dezembro de 1975, revigorado pelo Decreto nº 13.640, de 31 de dezembro de 1990, não se aplica aos seguintes produtos: maçã, pera, uva e ovo”.

Art. 4º Ficam alterados os dispositivos abaixo relacionados do Decreto nº 23.994, de 29 de dezembro de 2003, que passam a vigorar com as seguintes redações:

I - o inciso II do art. 43-A:

“II - do ICMS, nas operações internas de saída da sua produção, exceto em relação aos ovos”;

II - o inciso IV do art. 44:

“IV - de saídas internas de gêneros alimentícios de sua produção, exceto ovo, destinadas à merenda escolar da rede pública de ensino, quando adquiridos por órgãos da Administração Pública Estadual, nos termos e condições previstas em regulamento”.

A ideia da alteração tributária incidente sobre o OVO, certamente, é dar condições ao produtor de ovos amazonense. Porém, as consequências práticas da alteração podem impactar de sobremaneira o consumidor final, já que o mercado funciona à sua maneira às modificações.

Todos tinham direito à isenção do ICMS na revenda dos OVOS: tanto o produtor local como o revendedor de granjas estabelecidas fora do Amazonas. Com a nova medida, o ICMS passará a ser cobrado integralmente dos ovos que chegam de outros estados, à alíquota de 18%. Em outras palavras, os preços dos ovos, que chegam de outras UF terão um aumento considerável, provavelmente retirando essa concorrência.

Ninguém é tolo para pensar que o produtor local se contentará em manter o preço, se não tem um concorrente que possa oferecer o mesmo produto por condição mais vantajosa ao consumidor. O consumidor, ao ir até o supermercado comprar o ovo para sua refeição, não quer saber de onde vem a mercadoria, mas sim quanto custará.

Você, leitor, acompanhe o que estamos falando aqui. Quando for se abastecer, fazer suas compras do sagrado alimento de cada dia, observe a gôndola dos ovos. Tente lembrar o valor anterior ao mês de abril/21 e certamente verificará a diferença.

O produtor de ovos do Amazonas agradecerá ao Governo, mas os menos favorecidos terão que “ralar” muito mais para poder comprar uma proteína alimentar. E tudo isso sem nenhum tostão de aumento da arrecadação, porque acabou a isenção do ICMS dos ovos, mas concedeu 100% de crédito presumido sobre o valor apurado nas saídas dos ovos de produção local.

Estamos diante de um claro desrespeito pelos governantes amazonenses ao constituinte que, ao promulgar a Constituição de 1988 previu ser “vedado aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer diferença tributária entre bens e serviços, de qualquer natureza, em razão de sua procedência ou destino.” Onde está o princípio da isonomia? A depender dos nossos governantes, pouco importa a Constituição.

Hamilton Almeida Silva
Milton Carlos Silva

Advogados